17.4.09

VANITAS

Eu não devia escrever isto. O "eu" fatiga-me, mas não lhe resisto como não resisto muitas vezes ao meu reflexo nos vidros dos carros e das montras. Hoje o que aconteceu aconteceu na esplanada do Príncipe Real. Gosto das esplanadas na primeira hora da manhã nessa hora em que o ar está menos respirado e tem ainda o perfume do dia. Dizem que esse perfume vem das marés, como o vento. Estava vazia a esplanada e leio o Público. Sou fiel ao Público desde o seu início, lembro-me da descoberta de ser o primeiro jornal Português que tinha dois tempos de leitura, dava para ler ao balcão da confeitaria (na altura estava no Porto a estagiar e os pequenos almoços era numa confeitaria), em cinco minutos (títulos e subtítulos e alguns primeiros parágrafos dispersos) e dava para ler durante o almoço, desenvolvendo as notícias seleccionadas na leitura matinal. Depois o Público teve como jornalistas alguns dos meus amigos do Jornal de Coimbra(saudosa página Coimbra B), a Dulce Neto, o Pedro Rosa Mendes, o Miguel. A certa altura tropeço no que escrevi ontem sobre a assobiadela ao Ronaldo, estava na secção dos Blogues em Papel. Sempre me intrigou aquela secção e habituei-me a procurá-la nos tempos da primeira leitura, não por ter um blog, nem por gostar especialmente dos blogs, mas porque muitas vezes o que lá se publica tem a frescura de um ponto de vista completamente novo sobre um assunto tepidamente batido no dia anterior. Não é o caso do que escrevi e ali foi publicado, mas é o caso de muitas das coisas que ali aparecem todos os dias. Estranhamente o blog que mais gosto de ler ainda não o vi lá citado e é, como nenhum outro, uma espécie de "coro" grego com verdades ditas de forma lapidar, que se impõem ao ruído do discurso instituído. Esse blog chama-se "A-Questão-dos-Universais", ou "FunesEl Memorioso" e faz-me pensar que se deve ser difícil o trabalho de pesquisa - do que se escreve sobre o "assunto do dia" por esses blogues todos - já essa dificuldade seria certamente atenuada se aquele blog estivesse na lista dos consultados diariamente (veja-se a título de exemplo o que ali escreveu o fantástico Funes sobre a questão das custas judiciais no processo das famílias de entre os rios ou sobre Jorge Luís Borges).

Em suma, o que escrevi, tal como a imagem que vejo no reflexo dos carros e das montras, não têm nada mais de especial do que me devolverem o "eu", a evidência de que existo, evidência de que às vezes desconfio, desde míudo, mas isso é outra história, ou não!

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