Catálogo da Exposição Alba Atroz
Durante cerca de um ano pintei no Alentejo para esta exposição de que reproduzo alguns dos quadros (de fora ficam os de maior dimensão que serão três, também com a mesma técnica e sobre papel de Arches de 101,6cm / 152,4 cm). Todas as reproduções fotográficas foram feitas por Henrique Calvet, para o catálogo em papel de que reproduzo o texto e as imagens.
EXPOSIÇÃO DE AGUARELAS DE TIAGO TARON
21 DE FEVEREIRO 2009, 17h00 - GALERIA BERNARDO MARQUES – RUA D. PEDRO V, nº., 81 – 1250-093 LISBOA
21 DE FEVEREIRO 2009, 17h00 - GALERIA BERNARDO MARQUES – RUA D. PEDRO V, nº., 81 – 1250-093 LISBOA
1. APRESENTAÇÃO
Nasci em Lisboa a 1 de Janeiro de 1965, estudei Direito em Coimbra entre 1983 e 1989, comecei a pintar no Círculo de Artes Plásticas em Coimbra, ao mesmo tempo que fazia teatro no Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra. Fui advogado cerca de 18 anos mas nos últimos quatro anos a pintura começou a ganhar sendo uma actividade cada vez mais compulsiva e que me acompanha para todos os lugares (numa cigarreira tenho as aguarelas, nos bolsos do casaco – porque ainda está por inventar uma mala que um gajo possa usar sem ser para trabalhar – as canetas, o pincel e um frasco de médio para aguarela).
Pintei sempre para mim e, depois, para oferecer a quem estava perto das circunstâncias em que tinha pintado. Porém, aos poucos, as pessoas a quem oferecia os cadernos que trazia no bolso ou as folhas que tirava dos mesmos, foram querendo mais ou dizendo que alguém que os tinha visto queria ter um igual. Pinto como alguns escrevem, nos cafés, à noite nos bares (sobretudo no Majong e no Xafarix), nos Restaurantes (sobretudo no Pinóquio e no Fidalgo), nas esplanadas (sobretudo no Bairro Alto Hotel e no Adamastor). Enquanto o escritor “de rua” não é abordável, quem desenha é mais tarde ou mais cedo perguntado sobre o que está a fazer ou solicitado a mostrar o que faz. Foi assim que conheci muitas pessoas que se foram habituando ao despropósito da figurinha sentada a desenhar no escuro ou no meio do jantar.
Porque não desenho à vista qualquer lugar me serve. Nunca sei o que vou desenhando, seguindo o que as manchas de cor vão sugerindo, qualquer luz serve, mesmo as mais ténues.
Na primeira exposição que fiz (Galeria Vértice, Lisboa – 2007) confessei que a maior parte das aguarelas tinham sido pintadas e desenhadas à noite. A noite é ainda um dos últimos momentos, ou lugares, em que regressa aquela espécie da ilusão que em miúdo me fazia ver formas onde elas aparentemente não estavam mas que pela sugestão (dada por uma nuvem, copa de árvore ou poeira em rodopio com o vento) pareciam existir mais do que o suporte que as sugeria (a árvore, a nuvem, a poeira). Como disse, o que desenho é feito a partir das sugestões das manchas das aguadas, é assim uma espécie de desenhar ao contrário, quando começo não quero desenhar nada em concreto, quero apenas ter o gozo de ir desenhando o que vai sendo sugerindo pelas manchas de cor no papel. Não tem nada de mediúnico, ou de especialmente espiritual, ainda que pudesse servir para Analisar (o que não pretendo fazer).
Nesta exposição o tema dominante são as caravelas como eu as imagino vistas pelos índios quando chegaram a Terras de Vera Cruz. Os Índios tomaram-nas certamente por pássaros, seriam pássaros mágicos que transportariam homens igualmente mágicos. A ideia de um barco daqueles aparecer no meio do horizonte, no meio do mar e ir-se aproximando da costa até deixar ver a sua configuração, as enormes velas brancas, a mancha vermelha da cruz de Cristo. A imagem produz-me mais assombro do que a eventualidade de ver um ovni hoje. O maior pássaro de todos é o Albatroz, o do poema de Baudelaire que por coisas do destino o meu bisavó interpretou e reescreveu para verso em português precisamente há cem anos. A palavra pode desdobrar-se em duas - alba atroz e dá o branco atroz das folhas antes de serem desenhadas, antes de serem escritas. “As coisas são possibilidades realizadas contendo inúmeras possibilidades realizáveis” escreveu Teixeira de Pascoaes e a mim a folha em franco, antes do desenho que a realizará, angustia-me sempre nas suas inúmeras possibilidades realizáveis.
Estremoz, Amor aos Montes, Janeiro de 2009
Nasci em Lisboa a 1 de Janeiro de 1965, estudei Direito em Coimbra entre 1983 e 1989, comecei a pintar no Círculo de Artes Plásticas em Coimbra, ao mesmo tempo que fazia teatro no Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra. Fui advogado cerca de 18 anos mas nos últimos quatro anos a pintura começou a ganhar sendo uma actividade cada vez mais compulsiva e que me acompanha para todos os lugares (numa cigarreira tenho as aguarelas, nos bolsos do casaco – porque ainda está por inventar uma mala que um gajo possa usar sem ser para trabalhar – as canetas, o pincel e um frasco de médio para aguarela).
Pintei sempre para mim e, depois, para oferecer a quem estava perto das circunstâncias em que tinha pintado. Porém, aos poucos, as pessoas a quem oferecia os cadernos que trazia no bolso ou as folhas que tirava dos mesmos, foram querendo mais ou dizendo que alguém que os tinha visto queria ter um igual. Pinto como alguns escrevem, nos cafés, à noite nos bares (sobretudo no Majong e no Xafarix), nos Restaurantes (sobretudo no Pinóquio e no Fidalgo), nas esplanadas (sobretudo no Bairro Alto Hotel e no Adamastor). Enquanto o escritor “de rua” não é abordável, quem desenha é mais tarde ou mais cedo perguntado sobre o que está a fazer ou solicitado a mostrar o que faz. Foi assim que conheci muitas pessoas que se foram habituando ao despropósito da figurinha sentada a desenhar no escuro ou no meio do jantar.
Porque não desenho à vista qualquer lugar me serve. Nunca sei o que vou desenhando, seguindo o que as manchas de cor vão sugerindo, qualquer luz serve, mesmo as mais ténues.
Na primeira exposição que fiz (Galeria Vértice, Lisboa – 2007) confessei que a maior parte das aguarelas tinham sido pintadas e desenhadas à noite. A noite é ainda um dos últimos momentos, ou lugares, em que regressa aquela espécie da ilusão que em miúdo me fazia ver formas onde elas aparentemente não estavam mas que pela sugestão (dada por uma nuvem, copa de árvore ou poeira em rodopio com o vento) pareciam existir mais do que o suporte que as sugeria (a árvore, a nuvem, a poeira). Como disse, o que desenho é feito a partir das sugestões das manchas das aguadas, é assim uma espécie de desenhar ao contrário, quando começo não quero desenhar nada em concreto, quero apenas ter o gozo de ir desenhando o que vai sendo sugerindo pelas manchas de cor no papel. Não tem nada de mediúnico, ou de especialmente espiritual, ainda que pudesse servir para Analisar (o que não pretendo fazer).
Nesta exposição o tema dominante são as caravelas como eu as imagino vistas pelos índios quando chegaram a Terras de Vera Cruz. Os Índios tomaram-nas certamente por pássaros, seriam pássaros mágicos que transportariam homens igualmente mágicos. A ideia de um barco daqueles aparecer no meio do horizonte, no meio do mar e ir-se aproximando da costa até deixar ver a sua configuração, as enormes velas brancas, a mancha vermelha da cruz de Cristo. A imagem produz-me mais assombro do que a eventualidade de ver um ovni hoje. O maior pássaro de todos é o Albatroz, o do poema de Baudelaire que por coisas do destino o meu bisavó interpretou e reescreveu para verso em português precisamente há cem anos. A palavra pode desdobrar-se em duas - alba atroz e dá o branco atroz das folhas antes de serem desenhadas, antes de serem escritas. “As coisas são possibilidades realizadas contendo inúmeras possibilidades realizáveis” escreveu Teixeira de Pascoaes e a mim a folha em franco, antes do desenho que a realizará, angustia-me sempre nas suas inúmeras possibilidades realizáveis.
Estremoz, Amor aos Montes, Janeiro de 2009
2. O ALBATROZ
Ás vezes, no alto mar, distrae-se a marinhagem
Na caça do albatroz, ave enorme e voraz,
Que segue pelo azul a embarcação em viagem,
Num voo triunfal, numa carreira audaz.
Mas quando o albatroz se vê preso, estendido
Nas táboas do convés, - pobre rei destronado!
Que pena que êle faz, humilde e constrangido,
As azas imperiaes caídas para o lado!
Dominador do espaço, eis perdido o seu nimbo!
Era grande e gentil, ei-lo grotesco verme!...
Chega-lhe um ao bico o fogo do cachimbo,
Mutila um outro a pata ao voador inerme.
O Poeta é semelhante a essa águia marinha
Que desdenha da seta, e afronta os vendavaes;
Exilado na terra, entre a plebe escarninha,
Não o deixam andar as azas colossaes!
(Charles Rimbaud, na “interpretação em versos portugueses” do meu bisavô Delfim Guimarães. Flores do Mal, edição da Guimarães Editores de 1909. Precisamente. Há cem anos)
Ás vezes, no alto mar, distrae-se a marinhagem
Na caça do albatroz, ave enorme e voraz,
Que segue pelo azul a embarcação em viagem,
Num voo triunfal, numa carreira audaz.
Mas quando o albatroz se vê preso, estendido
Nas táboas do convés, - pobre rei destronado!
Que pena que êle faz, humilde e constrangido,
As azas imperiaes caídas para o lado!
Dominador do espaço, eis perdido o seu nimbo!
Era grande e gentil, ei-lo grotesco verme!...
Chega-lhe um ao bico o fogo do cachimbo,
Mutila um outro a pata ao voador inerme.
O Poeta é semelhante a essa águia marinha
Que desdenha da seta, e afronta os vendavaes;
Exilado na terra, entre a plebe escarninha,
Não o deixam andar as azas colossaes!
(Charles Rimbaud, na “interpretação em versos portugueses” do meu bisavô Delfim Guimarães. Flores do Mal, edição da Guimarães Editores de 1909. Precisamente. Há cem anos)
3. REPRODUÇÕES DE ALGUNS DOS DESENHOS
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
3. Caravela da Cabra da Memória
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
4. Cidade do Rio da Feira Popular
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
5. Caravela Nocturna
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
4. Cidade do Rio da Feira Popular
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
5. Caravela Nocturna
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 56cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 23cm / 31cm)
11. Penhasco 1
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 26cm / 36cm)
14. O Cais do Pirata
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 23cm / 31cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 23cm / 31cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 300 gr. 23cm / 31cm)
16. Nau Catarineta
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Arches 800 gr. 56cm / 76cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Moleskine - Bloco [aberto] 40cm / 12,5cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Moleskine - Bloco [aberto] 40cm / 12,5cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Moleskine - Bloco [aberto] 40cm / 12,5cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Moleskine - Bloco [aberto] 40cm / 12,5cm)
(Aguarela e caneta sobre papel Moleskine - Bloco [aberto] 40cm / 12,5cm)
7 comentários:
gosto muuito de quase todos. gostaria de ter a "Nau Catrineta". Está à venda?
Carlos,
Vai estar à venda, mas ainda não tenho os preços da galeria. Para já se depois de a ver continuar a gostar, será sua. Entretanto na exposição vão estar outros quadros que não foram fotografados e ao vivo - acredite - eles mudam, mudam muito. Se pudesse estar lá no dia 21 era excelente. Caso não possa terei todo o gosto em mostrar-lhe a exposição num dia - como se costuma dizer agora - à sua conveniência.
Nau Catrineta, Caravela das Mulheres, Caravela Nocturna, Abarca... que lindos, curisoso dois jornalistas gostarem dos mesmos traços.
Devemos andar perdidos neste mar de palha... Mando daqui um abraço para o Carlos Narciso, e espero vê-lo lá na inauguração-que-não-perderei.
Uma abraço
Ana Paula Cabral
Já lhe tenho dito, que gosto muito do que pinta e do que 'inventa-cria', mas esse desenho da caravela das mulheres tem alguma coisa de toque supremo!
Parabéns Tiago, estou muito curiosa de como os vou 'perceber' ao vivo.
Patti, tínha logo de gostar de um que tem um homónimo, lapsus calami (da minha parte) que me vai obrigar a rebaptizar um deles para que só haja uma "caravela das mulheres", ou então, se não se importar, faço como se faz com os barcos e marcarei a que gosta menos com o número romano II "Caravela das Mulheres II". Curiosamente não havia galés para as mulheres (só para os homens).Há quem diga que a origem das prisões está nessa limitação de não podendo estas ser condenadas àquelas, eram encarceradas. brrrrr.
Vi praticamente todos esses quadros a ser pintados mas os meus favoritos de longe são "Carvela nocturna" e "O Cais do Pirata" talvez por achar que por de traz de tanta criatividade se destacarem relativamente aos outros ou por simplesmente as cores serem mais alegres
um grande abraço
Vicente Taron
Querido filho, obrigado. Boas escolhas as tuas, talvez por os teres visto a serem pintados.
Enviar um comentário