26.11.09

JARDIM DO PRÍNCIPE REAL / 3º Dia


foto de Agostinho da Silva retirada deste sítio


Invocando o Vereador José Sá Fernandes autorização do IGESPAR para a realização da intervenção que decorre no Jardim do Príncipe Real, a que chama "Restauro do Jardim França Borges", resolvi enviar àquele Instituto a carta que se segue.


Entretanto, são já muitos os blogues (entre outros: este, este, este, este, e este) que se uniram aos protestos e, especialmente, ao pedido de uma urgente explicação para o que parece não corresponder à realidade, a afirmação daquele Vereador no sentido de que "Todas as espécies a substituir apresentam problemas fitosanitários graves." (ver aqui).


O critério de corte parece ter sido única e simplesmente o da localização física das árvores e não o da sua condição física (ou fitossanitária, para utilizar a expressão da Vereação). Entretanto num dos referidos blogues consta o seguinte: "É que o senhor Vereador respectivo afirmou há pouco em sessão pública de CML que eram apenas 6 árvores, todas doentes, e que só um era de grande porte. Está registado em acta.". No mesmo blogue contabilizaram-se 38 árvores. A empresa que procedeu ao corte tinha instruções e foi paga para proceder ao corte de 50 (cinquenta árvores, sendo esse o número constante do próprio orçamento).




A carta que seguirá hoje para o IGESPAR é a seguinte:





Ex.mo Senhor
Director do IGESPAR
Dr. Gonçalo Couceiro
Palácio Nacional da Ajuda
1349-021 Lisboa

Enviada por correio electrónico (dada a urgência do assunto) e por correio registado

Ex.mo Senhor,


Como será certamente do conhecimento de V. Excª. No passado dia 24 de Novembro terminou a Câmara Municipal de Lisboa o corte de todas as árvores que se encontravam no passeio do jardim do Príncipe Real.


Tanto quanto até ao momento se sabe, terão sido cortadas pelo menos 38 (trinta e oito árvores), que corresponderão, grosso modo, à totalidade das árvores situadas na referida extrema do jardim.


Salvo excepções, a regra, no que respeita à "saúde" das ditas árvores, é de que estavam bem e recomendavam-se.


Tenho a firme intenção de agir no sentido de procurar inverter o que este corte indicia e pressagia relativamente a um projecto de "requalificação" do Jardim Municipal França Borges, vulgarmente conhecido por Jardim do Príncipe Real.


Antes porém, e assumindo a minha enorme ignorância no que diz respeito a classificações da património, funcionamento do IGESPAR, articulação (no que se inclui subordinação) dos organismos Camarários à sua supervisão, gostaria que, se possível, me auxiliasse a compreender o seguinte:


Sendo o Jardim do Príncipe Real, para qualquer Lisboeta uma referência (como o Jardim Botânico ou o Jardim da Estrela) de arquitectura dos agora chamados "espaços verdes", não estará o mesmo de alguma forma classificado?


Será possível que só as árvores individualmente consideradas (e mesmo assim, apenas em função da sua idade ou categoria) estejam classificadas?


O Jardim como um todo, a sua arquitectura, as suas infra-estruturas, escapam a qualquer classificação, podendo no mesmo ser feito o que a Câmara Municipal de Lisboa entender?


Formulo estas perguntas com toda a sinceridade e sem qualquer tipo de reserva mental, na sequência do comunicado que li do Senhor Vereador Sá Fernandes, no qual afirmava que toda a pretérita e futura intervenção da Câmara Municipal de Lisboa, estava autorizada pelo IGESPAR. Ora, a confirmar-se quer a autorização, quer a correspondência entre o que já foi feito e o que se encontra autorizado, isso só pode significar que:

  1. O Jardim do Príncipe Real não está classificado, mas apenas algumas árvores do seu interior;

  2. O Jardim do Príncipe Real não constitui no seu conjunto (no qual se inclua a cerca de árvores que e delimitavam o passeio do jardim, património arquitectónico paisagístico com relevo suficiente para ser protegido.

Ora, estas duas consequências do duplo pressuposto de que parto (aprovação por parte do IGESPAR da intervenção da Câmara Municipal de Lisboa naquele Jardim e correspondência dessa actuação com o que foi autorizado), parecem-me difíceis de conciliar com o que eu supunha ser a função de um Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico. Na verdade, o que parece estar a acontecer aos jardins de Lisboa (veja-se o que aconteceu ao Jardim de Santos, Jardim de São Pedro de Alcântara e agora o que se parece anunciar para o Jardim do Príncipe Real) é, na minha opinião a descaracterização do que cada um deles tem de específico, de próprio, normalizando-se cada um deles como se pertencessem à mesma quinta, interrompida pela cidade.

Imaginar que se continuará no Jardim do Príncipe Real o que foi feito no Jardim de São Pedro de Alcântara é mais do que penoso, é um absurdo, se a isso acrescentar que o projecto de "requalificação", que incluía (como de facto incluiu) o abate de toda a cercadura de árvores (saudáveis) de um dos mais belos jardins de Lisboa, teve a aprovação deste Instituto, então já me sinto não no nível do absurdo mas do surreal, perdoe-me a comparação, mas seria como entender que um polícia ajudasse um ladrão de fruta a ensacar os dióspiros que deixara cair na fuga (só para dar uma imagem igualmente surreal).

Pelo exposto, muito agradecia a V. Excª. Que me confirmasse se de facto:

  1. o Jardim do Príncipe real não é, no seu todo, património arquitectónico (paisagístico) classificado ou de alguma forma protegido?
  2. O Instituto que V. Excª. superiormente dirige aprovou a intervenção já efectuada naquele jardim?

Admitindo a hipótese do Jardim do Príncipe Real ser património que mereça a protecção do IGESPAR, ou no caso da intervenção já efectuada não corresponder à que tenha sido autorizada, desde já rogava a V. Excª. que considerasse esta carta como denúncia da situação, tomando de imediato as medidas que estão ao seu alcance no sentido de impedir a continuação do que me parece uma agressão a um dos mais bonitos jardins de Lisboa.

Sem outro assunto e na expectativa da sua prezada resposta, envio os meus melhores cumprimentos,


Atentamente,


Tiago Taron

2 comentários:

João Camacho disse...

Muito bem. Subscrevo completamente. Arq.º João Camacho

Tiago Taron disse...

Caro João, é uma alegria sabê-lo por aqui.