17.11.08

TOQUES DE TELEMÓVEL; LUDOVICO ENAUDI




Ouço o meu toque de telemóvel em versão extensa, sem que o tenha de atender. Tenho no CD o disco de Ludovico Enaudi de onde escolhi a música (Divenire) para o toque do meu telemóvel, por mais que saiba que é o disco, quando começa a tocar tenho de me refrear para não olhar para o telefone e interromper o que estou a fazer.


É como os jingles da publicidade que se fazem a partir das músicas, quando as ouvimos na versão original, completa, desligada do anúncio, ou ao vivo como aconteceu quando os Pink Martini tocaram na Aula Magna o "je ne veut pas travallier, je ne veut pas déjener (…). Aquela música não se consegue descolar do anúncio, da época da vida em que o telefone tocava assim.


Ouça esta música e recordo mais de mim do que se ela não tocasse, com mais precisão, com mais elementos.


No instante em que a música começa desfilam recordações do tempo em que este toque entrou na minha vida, o dia em que seleccionei das músicas gravadas no telefone este toque. Dou comigo a pensar que antigamente, quando só podíamos escolher o toque que já vinha com o telemóvel isto também acontecia. Passados uns meses ou anos desse, se o voltava a ouvir lembrava-me logo desse tempo, da casa onde morava, das pessoas que então existiam na minha vida, do que era então o meu estado de espírito, enfim, do sabor desses tempos, de um telefonema a meio da noite em que acordei para uma notícia que volto a sentir.


Para mim com os toques dos telemóveis acontece o mesmo que com os perfumes, ou os cheiros: ambos conseguem catalisar memórias com uma presença que sem a sua intervenção nunca me chegariam. Porém a música é mais cinematográfica que os cheiros que não existem no cinema. Ouço a música que ainda toca e ocorre-me que cada toque de telemóvel poderia ser uma espécie de genérico de um filme sobre a época em que existiram. Há coisas que marcam épocas das nossas vidas, o tempo da primeira namorada , o tempo da segunda namorada, o tempo do primeiro carro, o tempo do segundo, por aí fora. Outras já marcavam e não sabíamos, os toque dos telemóveis que sucessivamente vamos tendo são uma delas.


Neste momento se trocasse de telemóvel iria importar este mesmo disco e manter o toque que já tenho há cerca de um ano, nunca mais quero ter a sensação "do tempo em que eu tinha este toque de telemóvel", é que estou cansado do peso do passado, sobretudo a lamechice do passado, sintetizado num toque de telemóvel que cada vez que volto a ouvir desencadeia uma espécie de flash que dizem preceder os instantes da morte, em que vemos a nossa vida toda. O toque é este --> http://www.youtube.com/watch?v=tAI2doCUbNc


1 comentário:

Carlos Júlio disse...

Peço-lhe que leia esta página:

http://
pessoaleintransmissivel.blogs.sapo.pt/17244.html