Vejo esta fotografia no Blog da Curiosa.
Arrepia.
Arrepia o nome da praia, Osso da Baleia,
a memória imprecisa de um acontecimento horrível há para aí vinte anos e agora esta imagem.
Imagino o silêncio e o vento que rodearam o clique da máquina.
O aproximar das pessoas com aquele andar que se vai progressivamente retraindo, pelo medo,
o mesmo que as leva até àquele corpo.
É Inverno e está frio,
o frio pertence àquela morte serena,
acho que também foi no Inverno que o crime aconteceu.
Encontrar a morte assim, num golfinho que para ali está a aterrorizar as crianças, em manhã de sol, vésperas de Natal,
a espalhar o mesmo sortilégio do ramo de flores numa curva da estrada - alguns são de plástico de cores pasteis, desbotados e fazem-nos assim, murchos, cabisbaixos;
da única fotografia emoldurada do mais amado da família, a preto e branco cada vez mais triste, como o olhar,
o mesmo que está nas fotos da página da necrologia,
o olhar que vem do vazio,
do vazio dos objectos que ficam sem dono,
do vazio do deixar-se deitar abandonado do cão que deixou de esperar,
sem dono,
do vazio do deslocado golfinho rodeado do silêncio dos outros.
Fotografaram-no e o que é mais estranho é que o vazio, como o golfinho, acabam por ser revelados na fotografia, estão lá os dois, lado a lado e sobrepostos.
Agora imagino que as pessoas se afastam até que o lugar fica despojado , só com o golfinho, que faz parte do lugar, como a noite em que deve ter dado à costa, como a noite do crime, como o vazio de todas as noites na Praia do Osso da Baleia.
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